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DESDE 2008

Perícia Criminal não tem segurança jurídica no Pará

18 agosto 2023
MIGUEL WANZELLER RODRIGUES*
Perito Criminal

A Perícia Criminal no Pará iniciou-se em 1891, executada pela Repartição de Polícia do Estado. Naquele mesmo ano, por decreto, esse serviço passou a ser desempenhado pelos inspetores sanitários do Estado, que atuavam em exames de corpo de delito e necroscópicos. Esses profissionais foram, então, os primeiros peritos criminais do Estado do Pará.

É importante destacar que, ao longo desses 132 anos, esse relevante serviço público obrigatório do Estado foi orientado por algumas leis e muitos decretos, alterando, inclusive, inúmeras vezes sua sigla dentro dos acanhados e insalubres compartimentos da Polícia Civil. Em 2000, entretanto, ela tornou-se autarquia independente da referida Polícia mediante a lei 6.282/2000, ficando apenas atrelada à Secretaria de Segurança Pública.

Com essa transformação e conformação institucional de ordem Jurídica, tornou-se referência nacional. Ganhou autonomia administrativa, financeira e operacional, além de muitas citações de organismos nacionais e internacionais militantes dos direitos humanos, inclusive, da indiana Asma Jahagir, da Comissão de Direitos Humanos das Nações Unidas, em 28 de janeiro de 2004, sobre “Direitos Cíveis e Políticos, incluindo a questão dos desaparecimentos e das execuções sumárias. (Boas-vindas ao estabelecimento de um IML independente em Belém que pode levar a cabo seus exames independentemente, apesar de forte pressão de uma inconformada polícia).

Embora sua importância e competência técnica sejam reconhecidas nacional e internacionalmente, ao longo dos últimos 23 anos, seus servidores acumularam perdas de garantias e direitos previstos na Constituição, das prerrogativas da função de polícia e perdas salariais, até então irreparáveis. Apesar disso e das dimensões continentais do Estado do Pará, com ocorrência de crimes ambientais, cibernéticos, tráfico de drogas, homicídios, suicídios, acidentes e crimes de menor potencial, os peritos executam perícias na maioria das áreas do conhecimento e em todo território de sua jurisdição. E precisam investir em educação continuada, acompanhar as tecnologias e se preparar, inclusive, para os avanços “do dinamismo dos crimes”.

 “Com um terço do quantitativo necessário, os peritos desdobram-se para dar suporte às Polícias”

Com um terço do quantitativo de peritos necessário para dar cobertura aos exames de corpo de delito e crimes de menor potencial ofensivo, esses profissionais (a grande maioria especialistas, mestres e doutores) desdobram-se em busca de qualificação. Ao mesmo tempo, necessitam garantir carga-horária para cobertura do seu trabalho, que é o de dá suporte às Polícias Civil e Militar, ao Ministério Público e ao poder Judiciário por meio da comprovação da materialidade das infrações penais e de sua autoria em todo o Estado.

Mundo voltado para a Amazônia

Hoje, o mundo está voltado para a Amazônia. Discute-se a fórmula e sua aplicação prática para evitar a catástrofe maior que vem sendo construída principalmente pelos países que já se tornaram grandes potências econômicas à custa da destruição da natureza ao longo do tempo de industrialização torpe e seus avanços, rapinando com violência as riquezas naturais de seus territórios, sem preocupação com o equilíbrio ambiental, sem estudos aguçados que alicerçassem o próprio equilíbrio ecológico e a sustentabilidade, e que protejam o planeta contra as degradações ambientais.

Então, é de singular importância que se acolham, dentro da lei, aqueles (os peritos) que se debruçam sobre os vestígios e indícios criminais para a caracterização da prova material de qualquer delito e ou desastre na parte da Amazônia paraense, inclusive de crimes contra o meio ambiente, de tráfico de drogas, de agressão ao cidadão de qualquer nível social, cultural, sem distinção de raça e etnia, com a intenção única e específica de ajudar a diminuir as injustiças, promovendo a Justiça com seu assessoramento pericial.

Atual Polícia Científica do Pará

Criada pela lei nº 9.382 de 2021, a Policia Científica do Pará apenas mudou seu nome, que era Centro de Perícias Científicas Renato Chaves. A mudança de nome, apenas, coloca em risco seus servidores, uma vez que não corrige as perdas das garantias e direitos previstos na constituição. Não recupera as prerrogativas inerentes à carreira de profissional policial, que também foram suprimidas com a promulgação da lei 6.282 de 2000, além de identificar os peritos como Polícia e caracterizar, como de Polícia, as viaturas que os conduzem para locais de crimes de altíssima periculosidade, acompanhando, por exemplo, missões especiais com outras polícias bem armadas, inclusive a Força nacional.

A gravidade dessa situação é acentuada uma vez que é da função e da responsabilidade da Polícia Científica exames em armas, exame de tiro de prova; transporte de drogas, de munições, de armas, de grandes quantias em dinheiro, de objetos de vultoso valor, de joias, que representam corpos de delitos relativamente comuns a serem encontrados em locais de crime, e, obrigatoriamente terão que ser custodiados e transportados pelos peritos e levados aos laboratórios específicos que geralmente estão nas sedes.

“A Perícia do Pará vive insegurança jurídica há 23 anos”

A Perícia do Pará, pois, vive a insegurança jurídica há 23 anos. Neste sentido, faz-se necessário que o Governo faça, urgentemente, esse reparo na lei através de PEC que já tramita no poder legislativo. Caso isso não aconteça, é previsível que a qualquer hora e a qualquer dia, vidas (de peritos) que andam nessas viaturas caracterizadas e identificados com uniforme de Polícia, sejam ceifadas sem a mínima possibilidade de defesa, pois para as facções criminosas não há distinções: são eles de um lado e as polícias de outro.

*Miguel Wanzeller Rodrigues é Perito Criminal Farmacêutico e Policial Científico (sem direitos e prerrogativas).